Albert Robida convida-nos a descobrir a sua idealização da sociedade francesa e da vida no século 20.
Estava repleta de utilitários voadores e comboios rápidos que ligavam as principais cidades europeias.
Nesta viagem pela “ficção especulativa”, Robida propõe-nos a sua materialização mais extraordinária — as redes sociais virtuais que demoraram cerca de 130 anos para se implementarem tal como a hoje as conhecemos.
Por vezes existem acasos em que alguém se perde imaginando mundos alternativos, rendendo-se a uma utopia que preencha o espaço do futuro e possibilite a inovação e o desenvolvimento técnico e humano.
Júlio Verne (1828 – 1905), terá sido aquele que, no mundo contemporâneo, encontrou maior reconhecimento como escritor de “ficção especulativa”, com as suas espectaculares narrativas de mundos futurísticos e máquinas incríveis.
Não era o único e, do laboratório “civilizacional” do século 19, outros também se revelaram capazes de, a seu modo, idealizar a tecnologia e as sociedades do futuro.

Fonte: Gallica. Bibliothèque National de France.

Fonte: Gallica. Bibliothèque National de France.
É o caso de Albert Robida (1848 – 1926), famoso ilustrador francês que também se dedicou à “ficção especulativa” e imaginou a sociedade francesa no ano de 1952.
Era uma sociedade totalmente dependente da electricidade, indispensável para o funcionamento das “aeroflechas”, dos “aérocabs” e dos “aero-paquebots”. Os faróis, que guiavam esses inúmeros veículos voadores, também dependiam da electricidade, assim como os “tubos” que ligavam cidades como se fossem proto-hyperloops, os sistemas de comunicação e o deserto do Saara que, com esse recurso, era fértil.
Numa altura em que se acreditava que a electricidade tinha poderes medicinais e curativos, dela dependiam, também, os meios de convívio social remotos através da videoconferência, assim como o ensino e o comércio à distância através do multifacetado “telephonoscope”.
É extremamente interessante apercebermo-nos como Robida idealizou o conceito básico da actual tecnologia social e comunicacional que combina imagem e som. Facilmente conseguimos identificar serviços como o Skype e o Zoom e, nas televisões, as televendas que evoluíram para histórias curtas e reels nas redes sociais.

A sociedade que Robida imaginou, estava longe de ser perfeita. Também vivam assombrados pela guerra e, na sua narrativa, encontramos imensas semelhanças com eventos ocorridos na Primeira Grande Guerra (1914 – 1918) e na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945).
Na visão peculiar de Robida, as armas biológicas eram largamente utilizadas, mas calibradas para poupar os “homens no auge da sua força e saúde” e visar, em vez disso, “os valetudinários, os fracos, os organismos enfermos incapazes de suportar os seus fumos pútridos”.

Fica evidente alguma romantização da guerra ao observarmos a ilustração de um regimento de soldados montados em bicicletas, com as lanças em riste, ao estilo das falanges gregas, assim como soldados de infantaria com armaduras.

Num exercício de expectativa contra a realidade, fica evidente alguma inocência, assim como, o quanto são falíveis as nossas observações do mundo e dos modos de vida futuros.
O que não muda é o romance e as casualidades que o despoletam.
O enredo da história desenvolve-se na sequência de um distúrbio meteorológico que afectou a rede de distribuição, colocando todos os serviços em modo redundante ou suspensos.

Foi esse evento que, através do “telephonoscope”, colocou em contacto Georges Lorris e Estelle Lacombe, dois jovens que acabam por se apaixonar.

Embora se note algum paternalismo e condescendência nos modos de tratamento das mulheres, o certo é que Robida, apesar de conservador, insere elementos verdadeiramente liberais e preconizadores da emancipação das mulheres, como o papel activo na sociedade, o acesso ao ensino superior, as uniões de facto e a coabitação livre.
Uma luta pelos direitos civis que ainda não terminou…